12/02/2012

MMA, vale tudo?

Quando em 2004 fui convidado pelo professor Luís Dorea pra ser médico de sua equipe na academia Champion não imaginava que aquela luta em que “valia tudo” iria se tornar um dos esportes mais competitivos e assistidos do mundo.
O MMA (Mixed Marcial Arts) hoje é o segundo esporte mais assistido do Brasil, e claro que tudo que é novo traz em si algumas desconfianças. Sendo o MMA a bola da vez, os críticos pregam de que ele é um esporte muito agressivo, chegando ao cúmulo de alguns dizem que nem esporte ele devia ser considerado.
Só mesmo desconhecendo os bastidores e as regras deste esporte se pode imaginar que ele não seja em sua magnitude o esporte do século. Suas regras, seus limites são muito bem especificados, tornando-o um esporte absolutamente seguro e regular. Milenarmente, se assim posso falar, os homens já se degladiavam, antes sem regras, mas como tudo no mundo e na historia evolui, chegamos ao atual MMA.
Como todo esporte ele tem suas lesões especificas e em função de boa parte destas lesões acontecerem na face, isso, às vezes, assusta ao expectador. Me perguntaram se achava o esporte agressivo, e minha resposta foi categórica: Não! Explico porquê: para que eu possa julgar a  agressividade de qualquer coisa, até mesmo de um esporte tenho que me basear em dados e comparações.
Na última década venho atuando junto ao futebol onde sou médico do Esporte Clube Bahia. Se considerar apenas de 2006 pra cá, e comparar o futebol com MMA, posso trazer um dado alarmante. No time do Bahia realizei mais de 30 cirurgias em função das mais diversas lesões: joelho, tornozelo, antebraço, ombro. Já na equipe do professor Dorea, não foram mais do que cinco. Olha que a equipe é muito grande. Dentre esses pacientes pude acompanhar Júnior dos Santos “Cigano”, nosso campeão mundial, desde o momento de sua lesão, 12 dias antes de disputar o título mundial. Quando o examinei ainda deitado no tatame tive a certeza da lesão do menisco e para tranquilizá-lo listei os jogadores de futebol que tinham sofrido lesões semelhante no ano anterior. Isso foi o mais interessante, pois rapidamente listei cinco atletas. Assim pude perceber o quanto agressivo é o futebol. Sorte termos meu colega Arivan Gomes, fisioterapeuta esportivo por perto e deu assistência imediata ao Junior.
Claro que ao ver uma laceração (corte) na face com sangramento assusta muita mais, mas o fato de assustar não significa que o esporte seja mais agressivo. Comparar o MMA com o futebol americano, por exemplo, é como fazer uma luta de Davi com Golias. O futebol Americano lesiona muito mais que o MMA e retira atletas de carreira profissional muito mais constantemente e é muito menos criticado. A verdade é que toda vez que se retrata um esporte de “luta” a agressividade vem à tona, pois todos imaginam uma disputa pessoal e sangrenta.
Também seria demagogia de minha parte falar que o MMA é inofensivo, claro que não. Hoje uma estatística feita por mim em mais de 20 eventos de MMA onde coordenei o departamento médico aqui na Bahia mostrou que 66% das lesões foram cortes, 24% contusões e 10% entorses onde envolviam as chaves de braço, de joelho, de tornozelo e outras . E sempre o que mais choca são aquelas contusões na face onde se forma um grande hematoma deformando o rosto do atleta. Claro que são lesões desagradáveis de se ver, mas são lesões, na sua grande maioria, superficiais de fácil tratamento onde muitas vezes apenas o gelo é o tratamento indicado.
O que vemos é que, ao se tornar atleta, seja qual for o esporte, temos em mente não se ele vai se lesionar , mas sim quando. As lesões esportivas são tão frequentes que hoje virou uma sub-especialidade da ortopedia, chamada Traumatologia Esportiva. Atleta, na essência da palavra, que não quer se lesionar deve procurar o xadrez ou a dama como esporte, pois nestes sim as lesões inexistem. Ou melhor, eles podem desenvolver Lesões por Esforço Repetitivo (LERs).
Brincadeiras à parte, o MMA vem se tornando cada vez mais um esporte competitivo e os treinos são cada vez mais intensos. O que vejo é que estatisticamente a maior parte das lesões não ocorrem em eventos oficiais, mas sim no próprio treinamento do lutador. Hoje o que não se pode é negligenciar os treinos, pois além de uma equipe preparada com os devidos equipamentos de segurança, a proteção nos treinos é fundamental. Grandes marcas mundiais como Everlast e Pretorian têm investido em equipamento cada vez mais seguros que minimizam esses riscos. Cabe ao esportista procurar profissionais que tenham capacidade, formação e infraestrutura para os treinar.
Outra grande mudança que vem ocorrendo são as alterações das regras, o que torna cada vez mais seguro a prática e a competição deste esporte.
Fazendo um paralelo com o futebol, quando eu era menino, lembro que não era obrigatório o uso de “caneleira”. Já hoje, nenhum jogador entra em campo sem. No MMA não é diferente, mas por ser mais novo que o futebol suas regras estão sendo ainda formadas. A criação da Confederação Brasileira de MMA vais ser um grande passo neste sentido. Em conversa com Carlão Barreto, que junto com Mario Yamasaki vem encabeçando este projeto, tive a certeza de que esta será mais uma vitória do MMA no combate à violência desleal.
O UFC, maior evento de MMA do mundo, ainda demonstrou uma preocupação especial em relação a seus atletas e criou um plano de saúde com seguro que cobre o tratamento desses atletas. Agora va você ser atleta de futebol, dependerá muitas vezes da boa vontade dos médicos do clube, a maioria dos clubes de futebol do brasil não tem um seguro de saúde pra seus atletas. Não quero aqui criticar o futebol, mas mostrar como o MMA vem se espelhando nos esporte de maior sucesso pra prolongar a vida esportiva de seu atletas. Hoje grandes nomes do MMA mundial como Minotauro, tem seu Fisioterapeuta (Dra Angela Cortes), Fisiologista (Pavanelli). Aqui na Bahia temos implantado essa cultura nos atletas junto com o Fisiologista Alexandre Dortas damos assistência a diversos atletas no intuito de promover saúde e prevenir as lesões.
Vejo um esporte promissor que aliado com grandes treinadores, proteções corretas, regras claras e atletas conscientes teremos cada vez menos lesões até mesmo aquelas que tanto impressionam. Sou carateca ha 30 anos, pratico boxe ha 10 e  fã do MMA, como médico sinto muito mais seguro de indicar a meu filho, Bruno de 6 anos a prática deste esporte do que o futebol, pois nesses poucos anos de vida dele, já o vi quebrar um dedo do pé, jogando futebol, torcer o tornozelo e perder duas unhas e no MMA a única dor dele foi quando, pra não de machucar, teve que bater 3 vezes no chão pedindo pra parar. Doeu, mas foi um bela lição de humildade.

Doutor Fábio Costa
Médico Ortopedista
Especialista pela USP em Joelho, Cirurgia Artroscópica e Traumatologia Esportiva
Coordenador Médico do Esporte Clube Bahia

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